segunda-feira, 25 de outubro de 2010

A fantasia de Norma



O domingo chegara... Estava na hora de usar sua fantasia preferida de dia das bruxas. Dia das bruxas? Não, jamais! Não num domingo! Se fosse terça ou quarta-feira tudo bem, mas num domingo jamais. O nome era inaceitável, mas a fantasia não.

As roupas curtas e cheias de reentrâncias como sempre, afinal gostava de se vestir assim. Pensou por um momento que estavam exageradas, mas os homens não olham pra decotes num domingo. Nos outros dias da semana, tudo bem... Mas se olhassem num domingo é porque eles que estavam errados, isso sim! Porque não se olha com malícia para coxas à mostra num domingo.

Entrou no carro e colocou uma música que edificasse, afinal de contas era domingo. Escondeu o cd da Lady Gaga que tocava a semana toda debaixo do banco, como se fosse uma droga ilícita. Particularmente, íntimo leitor, creio que deveria ser equiparado a tanto.

Voltemos a ela.

Sentou-se no lugar de sempre, deu sorrisinhos e tchauzinhos espevitados, levantou a mão quando todos levantaram e assentiu com a cabeça sempre que o engravatado em sua frente levantava o tom da voz. No envelopezinho timbrado, colocou seu ingresso mensal para a eternidade.

Quando voltou para o estacionamento, tardou para entrar no carro, era só uma questão de tempo até ser abordada.

Pronto.

Rizinhos histéricos, tapinhas no ombro, reprovação das condutas alheias, a bem ensaiada cara de escandalizada ao saber dos detalhes sórdidos. Muito discernimento, muita sabedoria, muita unção... Ouvira essas palavras a vida inteira e já aprendera a usá-las direitinho em cada frase.

Findo o informe, entrou no carro e voltou para casa. O sorriso sumiu, os olhos caíram e as sobrancelhas se uniram. Numa freada, o cd da Lady Gaga apareceu e foi direto para o player. Sua oficina de teatro semanal terminara e fora muito bem mais uma vez. Podia voltar, orgulhosa, para o backstage de seu dia-a-dia, sem se preocupar com sua performance durante os próximos seis dias.