segunda-feira, 20 de setembro de 2010

A forma de Virgínia lidar com a vida



Sabia que aquele momento chegaria. Chegou a apegar-se à ilusão de que não, mas sabia que haveria de chegar.



Ele chegaria e não havia outro jeito, tinham de se encarar. Já que seria obrigada a encará-lo, preferiu não encarar a si mesma e evitou os espelhos. Preferiu a procrastinação do encontro com a vergonha de seu próprio rosto. A vida toda fora assim: procurando adiar o inadiável. Por isso metera-se naquela situação. Se ao menos tivesse dito a verdade, o que realmente sentia... se começasse colocando um ponto final, como tantas vezes fora aconselhada pela canção! Mas agora já era tarde.



Às duas e trinta e oito, a campainha tocou. Como quisera atrasar um pouco mais o que tanto temia, arrastou os passos. Abriu a porta e ele entrou sem dizer palavra. O ressentimento enchia os olhos daquele que amou ardentemente tantas vezes.



- Café?



-Com açúcar mascavo.



E só.



Como por instinto, acabou lidando com a situação da única forma que sabia. Enquanto ele apoiava o pires sobre a bancada da cozinha, deixou que seus seios lhe roçassem levemente o ombro. Preparou o olhar cheio de malícia para lançá-lo nos olhos de sua presa. Bastou aquele gesto para que o corpo tomasse as rédeas e deixasse de lado a razão.



Momentos de confusão entre côncavo e convexo... Celebraram, de forma corrompida, o que deveria ser um dom precioso concedido pelo Criador.



Por fim, Virgínia deitou-se exausta enquanto ele abotoava a camisa e saía pela porta confusa. Mais uma vez, adiara o adeus. Até quando? Não importava, ainda o tinha em suas mãos.


sexta-feira, 10 de setembro de 2010

domingo, 5 de setembro de 2010

A peleja de Dorival para entender a Eternidade

-Ah, e outra coisa, aqui não existe tempo.

-Uhn?!

A conversa toda até ali fora surpreendente, mas aquilo já era mais do que um dia imaginara. Nenhuma pergunta ficara sem resposta, tudo aquilo que sempre quisera saber fora esclarecido. Porque as pessoas morrem, porque as pessoas sofrem, porque, afinal de contas, Ele criara as pessoas... Entre muitas outras.

Percebeu em certo momento que não precisava perguntar, era só deixar Ele falar que as respostas vinham. Bem no instante (?) em que ia perguntar quando poderiam se ver de novo, Ele veio com aquela:

-Ah, e outra coisa, aqui não existe tempo.

- Uhn?!

-É, não existe. Não precisamos dele aqui.

Não conseguia esperar a resposta, precisava perguntar:

-Mas, mas... E o pôr-do-sol? – disse lembrando saudoso dos fins de tarde passados em Ilha Grande.

-Você quer ver o pôr-do-sol? – e apareceu uma imensa bola de fogo alaranjada se escondendo por trás do azul infinito.

-Mas não é só isso, é que...

-É, eu sei... Precisei criar o tempo pra vocês porque vocês não conseguem ver as coisas da forma que Eu vejo. Não conseguiam, agora que estão comigo, conseguem. Vocês não saberiam apreciar o pôr-do-sol, o sorriso de uma criança, a beleza de uma amizade, o acúmulo de sabedoria e o prazer de viver ardentes amores, se não fosse pelo tempo.

-Mas e aqui?

-Aqui é a Eternidade. Você já tem noção do que é a Eternidade?

-É um bocado de tempo, né?

E mais horas (?) de conversa se seguiram.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Folha em Branco

Tem horas em que eu daria tudo por uma folha em branco. Não precisava nem estar imaculada, umas manchinhas de café ou uns furinhos de traça dão até um toque de requinte...


Olho pra essa folha, já escrita, quase furada pela borracha que tantas vezes já a apagou, cheia de riscos, rasuras e liquid paper. Como foi que eu deixei ficar assim? Não deixei, aconteceu. Fui escrevendo, escrevendo, sem ter o cuidado de ver o que estava saindo. Acabei me distraindo e quando fui ver já estava assim.

Oxi, que vergonha...


Tomara que ninguém veja... imagina se mamãe vê o que fiz com essa folha!


Amasso, jogo no lixo, mas não adianta, ela continua lá. Me olhando, me desafiando. Sabe que não consigo me livrar dela. Podia rasgar, queimar, acabar com a raça da maldita. Mas é a única que eu tenho, onde mais iria escrever?


Desamasso, aliso com as mãos, passo com ferro. E agora? Surge na mente o desafio de escrever de novo, dessa vez em vermelho-sangue... e não é que a danada tá alvejando? Quem diria... Logo com vermelho-sangue!